Portugal visto de dentro por um jornalista carioca
Jornalista há mais de 20 anos, fez diversas coberturas internacionais por O Globo. Escreve de Portugal desde 2017.
02/02/2024 02h42 Atualizado 02/02/2024
Exatos três meses depois de estrear, a nova agência de imigração de Portugal ainda deixa milhares de brasileiros à espera de autorizações de residência.
São trabalhadores como a brasileira Caroline Lima, titular de um dos quase 350 mil processos pendentes na Agência para Integração, Migrações e Asilo (AIMA).
Grande parte dos processos foi herdada do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), extinto em outubro. Mas começam a acumular pedidos que já deram entrada na AIMA.
É o caso de Lima, que foi à entrevista na AIMA em novembro e diz que o seu processo de autorização com visto de trabalho, e do marido, ainda estão em análise.
— Fui em novembro e levamos nossos documentos. Tenho trabalho e minha profissão pede que eu possa fazer viagens curtas a trabalho. Mas sem a residência, não posso — diz Lima.
Ela e o marido vivem no Porto, trabalham com tecnologia da informação. Emigraram após quatro anos de planejamento. Dizem que estão apreensivos porque veem os processos congelados.
— São quase 85 dias que fiz a entrevista e o prazo por lei para a resolução é de 90 dias úteis. Mas os processos não estão andando (…) Tenho medo de perder meu emprego, porque não tenho a autorização de residência — declarou Lima.
A engenheira civil Alaíde Rodrigues mora em Lisboa há nove meses. Ela trabalha em uma construtora há sete meses e afirma que há seis meses espera pela autorização de residência.
— Estou esperando o meu cartão de autorização de residência há seis meses. Vim legalmente, com o visto de procura de trabalho. Cumpri tudo como manda a lei, mas o SEF e a AIMA não cumprem a parte deles — disse a engenheira.
Ela contou que faz parte de um grupo de 298 brasileiros que estão ou estiveram na mesma situação. No final de dezembro, Rodrigues soube que o cartão seria emitido pela Casa da Moeda.
— Um mês. Sem nenhuma previsão de andamento do processo. Não consigo viajar para o exterior (tive prejuízos com viagens), trocar minha habilitação pela carta portuguesa e não consigo fazer financiamento no banco para comprar carro — disse Rodrigues.
Integrante do grupo, o gerente de contas André Valente disse que desistiu de esperar e está saindo de Portugal rumo aos Estados Unidos, onde morava.
— É só para me reorganizar financeiramente e depois aplicar novamente para Canadá, Austrália ou Espanha. A experiência com a residência em Portugal foi totalmente fora do esperado — disse Valente.
Ele conta que teve aprovado o visto para procurar trabalho em setembro de 2023 e se mudou no mês seguinte. Mesmo com emprego, não consegue vaga para agendamento na AIMA para pedir a autorização de residência:
— Meu visto não veio com agendamento no SEF/AIMA. Até então, era só ligar e marcar. Mas o sistema é arcaico. Somente por telefone e é preciso fazer centenas de tentativas para conseguir falar com alguém. Desde a criação da AIMA, não há vagas. Fiz uma reclamação na Procuradoria de Justiça.
Em outubro, o presidente da AIMA, Luís Goes Pinheiro, declarou que o prazo para a resolução das pendências seria de 18 meses:
— Todos gostaríamos que, no prazo de um ano e meio, a situação das pendências da componente documental ficasse debelada.
O objetivo foi mantido por Pinheiro na última semana, em entrevista à agência “Lusa”. Procurada, a AIMA não respondeu.
Em novembro de 2023, O governo ampliou a validade dos documento de permanência expirados a partir do dia 10 daquele mês até 30 de junho deste ano.
Porém, com uma condição, que não abrange a todos: "(…) desde que o seu titular faça prova de que já procedeu ao agendamento da respectiva renovação”, informou o decreto publicado no Diário da República.
Também há a promessa, definida em Conselho de Ministros, de renovar automaticamente vistos de imigrantes sem ficha criminal.
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